quarta-feira, 8 de outubro de 2025

O Relojoeiro das Estrelas e a Simplicidade dos Dias (por Ronaldo Campos)

 




Na cidade mineira de Juiz de Fora, nasceu aos 8 de fevereiro de 1884, um homem chamado Leopoldo Cathoud. Um nome que hoje, talvez, ressoe apenas nos anais empoeirados das ciências ou nos murmúrios de alguma memória antiga. Mas, ao descobrirem a sua história, perceberão que Leopoldo foi um grande mineiro! Um verdadeiro republicano! Um homem de letras e ciências que sempre acreditou no poder da educação como fator de transformação social.

Ele não um gigante de estatura, mas um colosso de inteligência, um farol de cultura que irradiava luz por entre as frestas do cotidiano, sem, contudo, ostentar um brilho ofuscante. Sua simplicidade era a grama verde que crescia em torno do palácio de sua mente.

Filho de Fritz e Joanna Cathoud, e sobrinho de Armando Santos Cathoud, Leopoldo começou sua jornada do saber nos bancos do Colégio Andrés, em sua Juiz de Fora natal, para depois se aprimorar no Lyceu de Barbacena. Mas a sede de conhecimento era vasta demais para as montanhas mineiras. Voou para a Europa, para a Suíça, terra de precisão e montanhas altaneiras, onde, como um aprendiz de alquimista do tempo, diplomou-se na Escola de Relojoaria e Eletricidade de Fleurier. Imagine o tilintar das engrenagens, o cheiro de óleo fino, o fascínio pelos mecanismos que medem o inexorável!

Por muitos anos, foi relojoeiro, mestre do tempo, e professor, mestre do saber. E não qualquer saber. Leopoldo Cathoud era um naturalista, um homem que decifrava os segredos da vida em Viçosa, na Escola de Agronomia, e destilava ciência nas Escolas Normais de Juiz de Fora e Belo Horizonte. Sua memória, diziam os que o conheceram, como Tabajara Pedroso, era um prodígio, um vasto arquivo onde se guardavam línguas, fórmulas, e talvez, quem sabe, o canto dos pássaros e o silêncio das estrelas. Ele era, ao mesmo tempo, um cientista de laboratório e um poeta do mundo natural.

Em Juiz de Fora, casou-se com Anna Gonçalves Coelho. Não tiveram filhos. Não deixou descendência de carne e osso, mas um legado de ideias, de ensinamentos, de uma vida dedicada à luz do conhecimento. Sócio de inúmeras sociedades e associações científicas, Secretário da Academia de Ciências de Minas Gerais – era como se a ciência mineira tivesse nele um de seus pilares mais robustos, ainda que silenciosos.

A morte, traiçoeira e repentina, veio apanhá-lo no posto de honra. Às 13 horas do dia 26 de outubro de 1942, em plena aula na Escola Normal de Belo Horizonte (atual Instituto de Educação de Minas Gerais – IEMG), o coração de Leopoldo Cathoud silenciou. Foi uma partida abrupta, como um relógio que subitamente para, mas deixando um eco de sua passagem.

Seus funerais, em justa e merecida homenagem, foram custeados pelo Estado. O corpo, tal qual um precioso instrumento, foi transportado de volta para Juiz de Fora, para o Cemitério Municipal. À beira da sepultura, a terra recebia não apenas um corpo, mas a memória de uma inteligência rara. Professores da Escola Normal de Belo Horizonte e o Dr. Américo Repetto, diretor da Escola Normal de Juiz de Fora, renderam-lhe as últimas homenagens, as palavras escorrendo como o tempo, medindo a perda de um homem que, em sua cultura extraordinária e simplicidade natural, foi um relojoeiro das estrelas e um mestre da vida.


Nenhum comentário:

Postar um comentário