segunda-feira, 6 de outubro de 2025

O Inquietante Relâmpago do Catatumbo


Esta não é uma história minha, mas eu vi o início, o meio e o fim dessa pequena tragédia pedagógica. E a moral é clara: comprar uma briga com um bando de alunos da quinta série (hoje, sexto ano) pode gerar consequências geográficas que duram anos.

Nosso protagonista era um professor de Geografia — não direi o nome, nem o local, para evitar que o pobre homem tenha seu nome indexado na busca do Google ao lado da Venezuela. O que posso revelar é que o mestre não era a pessoa mais paciente do mundo. Era do tipo que enxergava o programa escolar como uma linha férrea: qualquer desvio era um descarrilamento.

Estávamos no final de março, época das primeiras provas. A rotina era a mesmice gloriosa de qualquer escola: professores correndo para bater o conteúdo, alunos contando os minutos para o recreio. O professor em questão fazia uma revisão sobre a Estrutura da Terra, quando a Maria Clara, uma aluna com ares de detetive, resolveu agir.

— Professor, o que é o Relâmpago do Catatumbo?

A sala inteira parou. O silêncio que se seguiu não era de dúvida, mas de expectativa. Todos olhavam para o mestre como se ele estivesse prestes a ser desmascarado.

O professor, que naquele dia não estava com a menor disposição para curiosidades extraconcurriculares, franziu a testa.

— Não sei do que se trata, Maria Clara. Voltaremos ao magnetismo terrestre.

A sala explodiu em indignação silenciosa. Ora, o Globo Repórter havia feito um programa inteiro sobre o tal Relâmpago. Em uma época em que a televisão ainda era a grande unificadora cultural, não saber sobre a "fábrica de raios" do planeta — um fenômeno atmosférico tão insólito e duradouro sobre o Rio Catatumbo — era quase um atestado de alienação. Para eles, era um fenômeno tão fundamental quanto a Aurora Boreal ou o ciclo da água.

A notícia, claro, viralizou. Não pela internet, que ainda era discada, mas pelo bom e velho telefone sem fio do recreio. Na semana seguinte, na quinta série "A", o João Pedro levantou a mão:

— Professor, o que é o Relâmpago do Catatumbo?

O mestre bufou. A repetição já o irava.

— Já disse que não sei e não vou perder meu tempo com isso.

O ciclo se repetiu, sala após sala, semana após semana. O que era indiferença no início, logo se tornou raiva. O professor percebeu que aquilo era uma "trolagem" arquitetada pelos alunos. E, em vez de usar seu intelecto (que ele certamente tinha) e seu humor (que estava em falta) para desarmar a brincadeira, ele explodiu. Gritava, batia na mesa, ameaçava sair da sala e nunca mais voltar.

O professor havia cometido o erro fatal de um educador: ceder à teimosia de um garoto de doze anos.

A história não parou ali. O Relâmpago do Catatumbo ganhou ares de lenda urbana escolar. No ano seguinte, o irmão mais novo do João Pedro, já avisado sobre o "botão de pânico" do professor, fez a pergunta novamente na sua quinta série.

O professor, já amargurado pela perseguição, explodiu. A "briga" deixou de ser com os alunos atuais para se tornar um legado. A pergunta passou a ser um rito de passagem: a nova turma herdava a missão de, em algum momento da aula de Geografia, questionar o mestre sobre o fenômeno venezuelano, só para ver o circo pegar fogo.

A brincadeira durou anos. O professor ficou para sempre marcado por sua intransigência. Ele foi, ironicamente, transformado no avesso de um geógrafo: um homem que se recusava a saber sobre um dos fenômenos mais curiosos da Terra.

E assim, a lição de que o Relâmpago do Catatumbo existe não foi dada pelo professor, mas pelo silêncio obstinado de uma sala de aula. O mestre, com sua pouca paciência, acabou, sem querer, criando um novo item fixo no programa escolar: o temível Catatumbo, o fenômeno que, embora distante na Venezuela, o perseguiu ano após ano, sala após sala, numa teimosia quase tão incansável quanto a descarga elétrica sobre a foz do rio. E essa, meus amigos, é a prova de que a única coisa mais imprevisível que o clima é a inteligência de um bando de garotos entediados.



 

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